Eu nunca escrevi pra você, e, pra dizer a verdade, nem pretendia. 
Na verdade você sempre foi digamos que diferente demais pra que coubesse em qualquer palavra ou em um dos meus clichês. 
Você sequer já leu um texto meu. Irônico que o primeiro que eu possa vir a te mostrar seja um dedicado, não acha?!
Mas é que eu tenho tanto pra dizer; não só a você, mas também a mim. 
Eu tenho sentido tanto a sua falta… 
Nunca pensei que o espaço que você ocupava fosse deixar tamanho abismo quando esvaziado, e eu to falando de espaço na minha vida, porque ainda não quis parar e pensar no vazio do coração. 
Sabe, eu não quero ficar falando sobre coração ou sobre sentimentos, até porque sempre fui melhor fantasiando-os do que contando como realmente são.
Sentimento não é mesmo pra se ficar contando. 
O fato é que eu nunca soube exatamente o que sentia por você. 
Eu me lembro de deitar no teu colo e acalmar o peito, e também me lembro de você chegando de fininho e me surpreendendo com um beijo, que sempre vinha seguido de abraços e mais abraços, enquanto minha felicidade, naquele pequeno instante, alcançava o ápice. 
“Do you wanna know how many times I tore myself apart cuz you’re not here?!”
Lembra-se?
Pois é, eu não sei, mas você também não sabe a tortura que está sendo sem você aqui. 
E é diferente agora, porque das outras vezes eu sabia que te veria uma vez mais, que nos falaríamos de novo, mas agora nem sei se quando alguma esquina nos por frente a frente, vou poder me encaixar em teu abraço como antes. 
Eu nem sei se o destino vai nos permitir um novo encontro. 
Espero que sim. 
Espero ter de novo teu colo, teu ombro, teus braços e teus abraços.
E caramba, isso não é sobre você. 
Isso sou só eu falando da falta de você. 
Sou só eu admitindo coisas que sempre tive como inadmissíveis, e enxergando coisas que sempre me foram invisíveis. 
Esses dias eu estava me lembrando daquela noite que você bateu na minha porta; você usava aquela blusa gigante que eu odeio, e aquela calça agarrada que eu gosto menos ainda, mas também portava aquele sorriso largo que tanto me encanta. 
Eu saí feito uma louca procurando a chave do portão, e demorei pra achar porque você sabe, sempre perco tudo. 
Quando a encontrei e finalmente abri a grade que nos separava, eu pulei no teu abraço, lembra?! 
E nós ficamos sentados na calçada, olhando um ao outro, rindo, se estapeando, brincando, xingando, fazendo toda a bagunça que sempre foi tão nossa.
Eu não te contei, mas quando você me pegou no colo e aproximou teu rosto do meu, eu senti um arrepio que foi do pé ao cabelo; eu te quis. 
Mas como tudo que faço, aquele momento ficou pela metade, e as palavras sequer pensaram em ser pronunciadas. 
Eu deixei que se fosse, e você foi. 
Será que pensou em ficar? 
Será que por um momento passou pela sua cabeça voltar até mim e dizer tudo que eu já tinha lido em seus olhos? 
Não importa afinal você não ficou. 
Você esperou ser tarde demais pra me contar sobre todo o sentimento que existia aí dentro desse peito blindado que eu, não sei como, consegui penetrar. 
Quando você quis ocupar o lugar que te era reservado no meu coração, ele já estava ocupado, parte porque eu não sabia que o lugar era seu, e parte porque mesmo se soubesse, você nunca fez nada pra poder preenchê-lo. 
Você bem sabe que eu não entendo de sentimento, emoção; qualquer coisa que me dispare ou pare o coração foge da lógica, e eu fico sem saber o que fazer, sem entender nada do que está acontecendo.
Quando eu senti meu coração partir em incontáveis caquinhos por razões que nem me convém falar mas que você sabe bem, você estava lá, também sem saber o que ou como dizer, mas trazendo o conforto do teu colo, e tirando toda a dor que devia ser minha e pegando-a pra você. 
Você não conseguiu, sabe? 
Digo, arrancar a dor do meu peito. 
Pra falar a verdade ver você sofrendo por nós dois só a fez aumentar, porque aí me vieram à memória as nossas noites iluminadas pelo sorriso um do outro, e o pesar de ter deixado pra trás tudo o que de mais bonito podia ter nos acontecido. 
Me veio a culpa pela tua dor.
E eu fui ficando calada, sofrendo quieta, em silêncio, pra ver se assim a minha dor ia embora, e, consequentemente, a sua também. 
Eu não sei se meu teatro adiantou; não sei quanto a sua dor, mas a minha, ah… a minha ainda tá aqui, sabe? 
Não se passa um dia sem que o remorso de ter impedido tudo que eu nem sei o que seria me culpe.
E como se não bastasse isso, me vem você agora, me julgando mentirosa, dizendo que nada que você faça tem importância pra mim. 
Caramba, você não sabe a importância que tem! 
Mas nem eu sabia disso, como queria que eu mostrasse-a a você?! 
Eu não enxergava até então toda nossa magia, ou se enxergava, fazia-a se apagar da mente.
Talvez isso tudo seja a falta.
A falta, você sabe, é uma droga injetável alucinógena. 
Você não quer, mas de repente vem alguém e enfia em você a agulha cheia de falta, e ela penetra no teu corpo te fazendo lembrar tudo que já foi e nunca mais vai ser. 
Te faz pensar nos toques já sentidos, nas palavras já ouvidas, e você fica lamuriando pelos cantos, pensando em quando o efeito da maldita vai passar. 
E eu já estou delirando mesmo.
E olha que eu não bebo, nem fumo, e nem cheiro, e nem injeto e nem qualquer uma dessas porcarias tidas como boas. 
Você bebe e fuma, mas nunca me deixou fazer nenhum dos dois.
Dizia que é errado e que faz mal, e mesmo assim nunca atendeu a minha quase súplica de largar teu cigarro de maconha ou tuas misturas alcoólicas. 
Você sempre foi tão errado. 
Mas mesmo com tudo de incorreto que você fazia e ainda faz, mesmo com tua imaturidade, mesmo com tanta coisa que tanto me irrita e faz com que eu me afaste, eu sempre voltei -e volto ainda se você quiser- correndo no primeiro pedido fajuto de desculpas por algo que nem errado você julga ser. 
Tá vendo?! 
Você é bem maior em mim que eu pensei que fosse.
Isso não é sobre você!
Isso sou só eu falando da falta de você. 
Isso sou só eu admitindo um zilhão de coisas que sempre estiveram aqui, mas que eu nunca me permiti saber. 
Caramba, isso sou só eu sentindo falta.


(Alice Fercon)


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